segunda-feira, 9 de março de 2009

O ofício de Paulo


Vários são os momentos das suas cartas em que Paulo se refere ao seu trabalho como forma de sustento próprio. Muitos estudiosos têm tentado perceber que tipo de trabalho era esse e que importância tinha na missão de Paulo. Faço aqui um breve resumo a partir do capítulo 4.1 da obra Pablo de Tarso e los origenes cristianos, de Giuseppe Barbaglio.

Em Act 18 ficamos a saber que, assim que chega a Corinto, Paulo emprega-se no atelier de Aquila e Priscila. O termo usado é zkenopoios, fazedor de tendas (mas também pode significar trabalhador do couro).
Talvez tenha aprendido este ofício com o seu pai, como frequentemente acontecia entre os judeus, segundo a doutrina dos rabinos que obrigava o pai a ensinar um ofício aos filhos, ao mesmo tempo que se empenhavam no estudo da lei mosaica.
Nas suas cartas Paulo nunca diz qual o trabalho de que se ocupava. Em 1Ts 2, 9, diz que trabalhava duramente noite e dia para não ser um peso para ninguém. Em 1 Cor 4, 12, diz: «cansamo-nos a trabalhar com as nossas próprias mãos», integrando essa necessidade de trabalhar na via crucis que tem de percorrer diariamente como discípulo do Senhor.
Paulo não precisaria de trabalhar, se não quisesse. As comunidades concerteza mantê-lo-iam. Mas para ele era essencial não se tornar pesado às comunidades e, a isso, aliar a liberdade e a eficácia de um anúncio gratuito e desinteressado. Como dizia em 1Cor 9, 15-18, «Eu, porém, não me aproveitei de nenhum desses direitos, nem tão pouco estou a escrever para os reclamar. Preferiria antes morrer do que... Ninguém me poderá privar deste título de glória. Porque, se eu anuncio o Evangelho, não é para mim motivo de glória, é antes uma obrigação que me foi imposta: ai de mim, se eu não evangelizar! Se o fizesse por iniciativa própria, mereceria recompensa; mas, não sendo de maneira espontânea, é um encargo que me está confiado. Qual é, portanto, a minha recompensa? É que, pregando o Evangelho, eu faço-o gratuitamente, sem me fazer valer dos direitos que o seu anúncio me confere.» O prémio do Apóstolo não está nas coisas materiais e o anúncio do Evangelho não é um projecto dele, mas de Jesus. Não era no dinheiro que Paulo estava interessado, mas nas pessoas: «não procuro as vossas coisas mas a vós mesmos» (2Cor 12, 14). Exactamente por este motivo é que Paulo gastará a sua vida ao serviço das comunidades que visita, em nome do Evangelho de Cristo. Não há salário que pague a vida de Paulo, só Cristo Crucificado, centro da pregação do Apóstolo, paga essa dívida!
Mas entenda-se que o facto de decidir sustentar-se a si mesmo, Paulo não ficou cego com esta opção. Por isso, quando estavam postas de lado todas as possibilidades de mal-entendidos acerca das suas intenções, não recusava a ajuda das comunidades (Cf. Fl 4, 14-16).
No contexto cultural de Paulo, o trabalho manual não era visto pelos hebreus como humilhante, como se pode constatar pela história do povo de Deus que nos é transmitida através das Escrituras. O homem que trabalhava não era um ser inferior e muitos rabinos, paralelamente à função de ensinar, mantinham trabalhos manuais como forma de viver sem sobrecarregarem os discípulos. Mas se nos referirmos à cultura greco-romana, isso já não era assim. O trabalho manual era olhado de forma depreciativa. O ideal era que o homem pudesse dedicar-se inteiramente à formação do espírito deixando os trabalhos manuais para os escravos. Claro que esta atitude era suportada pelos grandes filósofos gregos como Aristóteles e, também, pelos letrados romanos, como Cícero.
Neste contexto, nas cidades onde se encontrava, Paulo pertencia às camadas mais baixas da sociedade, facto de que ele próprio tinha consciência, como se vê em 2Cor 11, 7, quando se refere humilhado: «Porventura cometi alguma falta, ao humilhar-me para vos exaltar, quando vos anunciei gratuitamente o Evangelho de Deus? Despojei outras igrejas, recebendo delas o sustento para vos servir, e encontrando-me necessitado no meio de vós, não fui pesado a ninguém, pois os irmãos vindos da Macedónia é que proveram às minhas necessidades». O que importa considerar é que, por causa dos trabalhos que realizava, não podemos incluir Paulo na camada dos incultos, como pensavam os gregos, mas entre os cultos, como provam as suas cartas.
Podemos pensar que o seu trabalho o privava de tempo precioso à evangelização, mas o facto é que Paulo nunca deixou de encontrar ocasiões para evangelizar quer estivesse a trabalhar, quer estivesse preso, quer estivesse a viajar de barco entre cidades. Aliás, este é um aspecto não depreciável do seu trabalho: a pregação no contexto de uma comunidade de vida e trabalho.

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